Crianças e seus cuidados! (Parte 2)

 Ao se relacionar com o grupo, que são os iniciadores sociais, os pequenos sofrem intervenção direta no processo de desenvolvimento, acontecendo a simbiose afetiva e o sincretismo subjetivo, que H. Wallon, ao estudar a influência dos grupos na evolução do sujeito, ressalta que, além de serem importantes para a aprendizagem social, também o são para a constituição de sua pessoa, "dessa maneira, as relações da criança com as pessoas de seu meio são marcadas por influências recíprocas" (WALLON, 1975b, p.164). Contribuindo com J. Piaget, que salientou que no relacionamento entre o adulto e a criança, essa última procura espelhar o outro, gerando o que o psicólogo suíço chamou de "fatores de troca", podendo ocorrer também quando interage com outras crianças, "essas intercomunicações desempenham igualmente papel decisivo para os progressos da ação" transformando as condutas materiais em pensamentos (PIAGET, 1967, p. 26).“Um “eu ideal”, como disse Baldwin, se propõe ao eu da criança, e os exemplos vindos do alto serão modelos que a criança deve procurar copiar ou igualar. São dados ordens e avisos, sendo, como mostrou Bovet, o respeito do pequeno pelo grande que os torna aceitáveis e obrigatórios para as crianças. Mas, mesmo fora destes núcleos de obediência, desenvolve-se toda uma sobmissão inconsciente, intelectual e afetiva, devida à coação espiritual exercida pelo adulto” (PIAGET, 1967, p.25). Como bem pontuou J. Piaget, todas as transições extremas que o pensamento da criança vai passar, estão concentrados no período das idades entre dois e sete anos (2 a 7 anos). O pensamento por incorporação ou assimilação, que tem como marca a visão egocêntrica do mundo, posteriormente sendo dominado, paulatinamente, pelo pensamento adaptado aos outros e ao real, preparando esse ser para o pensamento lógico. O início da socialização é importante para a inteligência e para o pensamento, segundo o pesquisador suíço, e repercute profundamente na afetividade, daí a preocupação com quem está cuidando dessas crianças.
“Como já entrevimos, desde o período pré-verbal, existe um estreito paralelismo entre o desenvolvimento da afetividade e o das funções intelectuais, já que estes são dois aspectos indissociáveis de cada ação” (PIAGET, 1967, p.37).
Segundo H. Wallon a partir de três anos, a criança entra nas fases distintas que ele chamou de: OPOSIÇÃO, SEDUÇÃO E IMITAÇÃO. Sendo que aproximadamente aos três anos inicia-se a fase da oposição, marcada pela resistência que ela tem contra tudo e contra todos, sentindo até prazer em contradizer e confrontar, disputar objetos, fazer manha, simular; Posteriormente a essa fase, surge a fase da sedução, ela agora sente necessidade em agradar, de ser aceita e até admirada, saber que faz a coisa certa e agrada os outros, busca atenção total, fica exibida, ciumenta e competitiva, sendo uma etapa decisiva para o desenvolvimento dela, "se não forem bem orientadas pelo adulto, podem marcar de forma duradoura o comportamento da criança nas relações que estabelece com o ambiente" (BASTOS & DÉR, 2008, p. 43). A seguir vem a fase da imitação, é quando o outro serve de modelo para o comportamento e conduta, incorporando manias e costumes da pessoa admirada.
“Esse estágio caracteriza-se por um intenso trabalho afetivo e moral. O segredo impõe-se à consciência infantil; a criança já sabe distinguir entre o que deve ser a sua vida secreta, isto é, sabe dissimular sentimentos e atitudes que poderiam ser desaprovados pelo adulto, guardando-os para si” (BASTOS; DÉR, 2008, p.45).
 Mahoney (2008, p. 15) escreveu que a inteligência motora, afetiva, cognitiva e a própria pessoa, estão tão interconectadas "que cada um é parte constitutiva das outras" e a separação é utilizada apenas para facilitar a descrição de processos.
 “Qualquer atividade motora tem ressonâncias afetivas e cognitivas; toda disposição afetiva tem ressonâncias motoras e cognitivas; toda operação mental tem ressonâncias afetivas e motoras. E todas elas têm um impacto no quarto conjunto: a pessoa, que, ao mesmo tempo em que garante essa integração é resultado dela” (MAHONEY, 2008: P.15).



 Contribuindo com PIAGET (1967, p. 38) que afirmou: "Não há ação puramente intelectual" e com WALLON (1975b, p. 164) que disse: "O socius é o suporte da discução interior, da objeção às determinações ainda duvidosas"; confirmando que quando delegamos os cuidados de uma criança a terceiros, sem a certeza de que esse indivíduo está capacitado para essa tarefa, estamos comprometendo não apenas um momento de aprendizado ou de diversão dessa inocente criança, mas sua vida psíquica inteira.
 Recentemente, a mídia repercutiu o caso do médico da equipe de ginástica olímpica americana, foram mais de 20 anos molestando crianças e adolescentes, entregues em suas mãos pelos pais e pela federação, mas é noticiado que abusos contra menores também acontecem em igrejas, inclusive é a história do filme ganhador do Oscar de Melhor Filme de 2016, Spotlight valorizando o jornalismo investigativo e provocando uma reflexão sobre um dos problemas mais vergonhosos da Igreja Católica: a pedofilia. Fatos como esses comprometem os valores morais dos indivíduos, como escreveu PIAGET (1967: p.59) “pode-se dizer, então, que o respeito mutuo, que se diferencia gradualmente do respeito unilateral, conduz a uma organização nova dos valores morais”. Refletindo em problemas sociais, pois uma sociedade imoral é insustentável, segundo o filósofo Clóvis de Barros filho, que escreveu em seu blog, Pensamento Contemporâneo:
“Essa sociedade é a família; [...] Mas, sobretudo, a cidade, a polis. A discussão sobre a vida boa, contemporânea da própria Filosofia, corresponde a como ser virtuoso na cidade. Porque esta última sucede a família como centro gerador de eticidade. [...] O fundamento do ser, como defendia Montaigne e Marcel Conche, é puramente moral” (BARROS FILHO, 2017).
            Ao refletirmos sobre os fatos narrados acima, nos damos conta de que em milhares de igrejas que existem Brasil afora, as crianças podem estar passando por situações parecidas ou piores, o caso dos padres pedófilos investigados em Boston/EUA, se fosse em uma “igrejinha de fundo de quintal” jamais tomaria a proporção midiática que alcançou, mas devido ao tamanho dessa denominação o caso chegou a virar filme de Hollywood com direito a Oscar, mas e as nossas crianças, será que estão seguras nessas igrejas que não recebem tamanha atenção da mídia? Não é apenas a pedofilia (como se isso fosse pouco) que tem o poder de marcar uma criança para a vida toda, segundo Mednick (1969, p. 24) situações de medo, reais ou não, podem culminar em ansiedade e problemas mentais pelo resto da vida.
“O pensamento anormal e aberrativo é, na realidade, uma reação da pessoa mentalmente enferma, que esta aprendeu a fazer quando se sente amedrontada. O pensamento “tresloucado” permite-lhe furtar-se à realidade presente e, por conseguinte, serve para reduzir o seu medo” (MEDNICK, 1969, p.24).
            Quais são os métodos que os professores (as) das igrejas utilizam para administrar essas crianças? Será que em algum momento fazem ameaças, dão sustos ou as colocam em situação vexatória? Quem sabe se utilizam de frases do tipo: “Se não obedecer a tia o diabo vai te pegar!” ou “quem mente é filho do diabo”, criando um estado de medo nessas crianças. O ambiente onde essas crianças ficam durante os cultos são projetados para recebê-las? Em caso negativo, certamente haverá perdas para o desenvolvimento desses jovens, segundo Duarte & Gulassa (2008, p. 20) “a criança, portanto, inicia sua vida imersa no mundo social que a rodeia, recebendo dele o significado e as respostas a suas necessidades” sendo o indivíduo “um ser intimamente e essencialmente social”, não em virtude dos ambientes exteriores, “mas em consequência de uma necessidade íntima. Ele o é geneticamente”. Então, não são apenas os professores (as) que necessitam estar preparados para essa missão, pois de nada adiantará ter pessoas hiper capacitadas se o ambiente onde ministrarão as “aulas” não for planejado para a faixa etária adequada, pois cada período da criança “é considerado importante em si, e quanto mais intensamente é vivido melhor contribui para a construção do período posterior”, de acordo com a contrapartida afetiva, social e do ambiente “a criança associará determinadas respostas ao atendimento de determinadas necessidades”, condicionando e transformando as ações impulsivas e improvisadas em “formas de ação sobre o meio externo” (DUARTE & GULASSA, 2008, p.20).

“É dessa osmose afetiva entre a criança e seus envolventes que surge o início da vida psíquica, a consciência subjetiva, na qual vão se formando as primeiras imagens mentais e nas quais se imprimirão as primeiras marcas de sua individualidade” (DUARTE & GULASSA, 2008, p.25).
No decurso do desenvolvimento das funções cognitivas infantil, caracterizado por etapas que se sucedem, segundo Piaget (1967, p. 98), “só as últimas (a partir de 7-8 e de 11-12 anos) marcam o término das estruturas operatórias ou lógicas”; todas essas etapas se orientam nesse sentido: lógico. E o desenvolvimento não ocorre sem o “processo de equilibração”, que distingue “as estruturas lógicas e pré-lógicas relacionadas, essencialmente, com o caráter”. Então, ao expor a criança à ambientes coletivos ou individuais disformes, estamos imprimindo marcar profundas nesses jovens. Ao resumir a questão, Piaget (1967, p. 98) escreveu que “as estruturas lógicas são prefiguradas em todos os níveis por estruturas mais frágeis, mas que lhes são parcialmente isomorfas e que constituem seus esboços”. MAS ISSO É ASSUNTO PARA O PRÓXIMO POST, forte abraço! 

Crianças e seus cuidados! (Parte 1)

 KLAI FERREIRA

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